o verão envelhece, mãe impiedosa (Sylvia Plath)

sexta-feira, 28 de dezembro de 2012

LÊDO IVO CONTINUA VIVO

APENAS TOMOU O CAMINHO DO 

HOSPÍCIO



ASILO SANTA LEOPOLDINA


Todos os dias volto a Maceió.

Chego nos navios desaparecidos, nos trens sedentos, nos aviões 

cegos

Que só aterrizam ao anoitecer.

Nos coretos das praças brancas passeiam caranguejos.

Entre as pedras das ruas escorrem rios de açúcar

Fluindo docemente dos sacos armazenados nos trapiches

e clareiam o sangue velho dos assassinados.

Assim que desembarco tomo o caminho do hospício.

Na cidade em que meus ancestrais repousam em cemitérios

marinhos

só os loucos de minha infância continuam vivos e à minha 

espera.

Todos me reconhecem e me saúdam com grunhidos

e gestos obscenos ou espalhafatosos.

Perto, no quartel, a corneta que chia

Separa o pôr-do-sol da noite estrelada.

Os loucos langorosos dançam e cantam entre as grades.

Aleluia! Aleluia! Além da piedade

a ordem do mundo fulge como uma espada.

E o vento do mar oceano enche os meus olhos de lágrimas.


Lêdo Ivo


Nenhum comentário:

Postar um comentário