o verão envelhece, mãe impiedosa (Sylvia Plath)

quinta-feira, 3 de maio de 2012

Para o livro de Literatura de segundo grau


Não leias odes, meu filho, lê os horários
(dos trens, dos ônibus, dos aviões):
são mais exatos. Abre os mapas náuticos
antes que seja tarde demais. Sê vigilante, não cantes.
Chegará o dia em que eles, de novo, pregarão listas
no portão e desenharão marcas no peito daqueles que dizem
não. Aprende a ir incógnito, aprende mais do que eu:
a mudar de bairro, de passaporte, de rosto.
Entende da pequena traição,
da salvação suja de todos os dias. Úteis
são as encíclicas para se fazer fogo,
e os manifestos: para a manteiga e sal
dos indefesos. É preciso raiva e paciência
para se soprar nos pulmões do poder
o fino pó mortal, moído
por aqueles, que aprenderam muito,
que são exatos, por ti.







Poema: Hans Magnus Enzensberger
Tradução: Kurt Scharf e Armindo Trevisan

Imagem: Carlos Vergara

quarta-feira, 2 de maio de 2012

adeus às coisas aqui embaixo


tento morrer agora
que os cinquenta anos
travam meus pés
numa armadilha
e a poesia continua a ser
minha ocupação
não posso dar um passo
à frente nem atrás
preciso tentar a morte
com determinação
atento à voz do Cosmo
aos gritos de Minerva
morrer no mais refletido
onde chego a ser dois
enxertado em livros
léxicos tipografias
hastes subterrâneas
sem nada levar da arte
além da minha loucura




poema: ney ferraz paiva
imagem: graciela itubirde