Acabava-se de morrer minha morte
Hélène Cixous
Há dez dias morria em Belém do Pará o poeta Max Martins.
Deixou uma poesia maior do que nós e ele próprio talvez percebesse. Exigia-se muito, o máximo, mas jamais a perfeição. Como ele mesmo disse: “Eu sujei a perfeição”.
Rivalizava-se com a palavra, aspirava uma obra em que os pontos de
tensão se multiplicavam e distendiam de um livro a outro. O zen era uma fraude.
O zen era uma farsa. Sua escrita se movimentava num espaço de violência ativa,
de combate e ruína. Max vivia e pensava a linguagem. Relação incomensurável com
a poesia permanentemente renovada pela experimentação que nos deu a alegria de
dois livros geniais, incomuns, de quem jamais cedeu e só assim pôde realizar
seus grandes feitos - O risco subscrito (1980) e Caminho
de Marahu (1983).
Livros que são mais poesia do que pode conter a amesquinhada biblioteca de toda
literatura paraense.
Max não era o poeta de um lugar. O lugar permanece inconfessável.
Max escreve num trânsito de memória, delírio, esquecimento.
O que lhe nega a língua, o mutismo das representações e da
intimidade. O silêncio de quem nada tem a confessar, nem seu léxico a revelar.
Seu texto é sempre Outro. Nômade. Sem rosto nem pertences. Há, claro, ramificações
e revezamentos diversos e intensos. Dos mais antigos: Walt Whitman, Carlos Drummond, Murilo Mendes, Paulo Plínio Abreu, Mário Faustino, Robert
Stock, aos mais
recentes: Ingeborg Bachmann, Thomas
Bernhard, Edmond Jabès.
Max apartava-se do testemunho documental. Não queria ser o poeta
das pequenas histórias ou das grandes tiradas do momento na sala de festas da
oficialidade local. Nem procurou escapar pela saída de emergência dos contos nem das
crônicas nem do jornalismo. Foi poeta apenas. Poeta da palavra com as consequências
e implicações tremendas.
Fez a sua escolha de poeta e manteve até o fim os caminhos de sua
aposta. Uma aposta pela grande poesia. E lançou sorte à sua morte. E viveu sem concessão o seu delírio.
Ney Ferraz Paiva 20.02.2009
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